Antes de começar vou fazer uma breve diferenciação dos CRIs Corporativos dos CRIs Pulverizados.
CRIs corporativos são aqueles onde o devedor é uma empresa. Já no CRI Pulverizado o devedor também é uma empresa, mas nesse caso ela cede uma carteira com a dívida de centenas ou milhares de pessoas físicas, sendo assim o CRI recebe dinheiro diretamente das pessoas físicas e a empresa só é acionada caso essa carteira de recebíveis não seja suficiente para pagar as prestações.
Após a leitura desse material procure pelas postagens que pretendo fazer sobre CRIs que deram problema.
A seguir apresento as garantias / medidas de segurança mais comuns em CRIs Pulverizados:
1º) Cessão de recebíveis em conta separada: Nos
CRIs pulverizados os recebíveis de um ou mais empreendimento são cedidos para o
CRI, de forma que quando os devedores pessoa física paguem o dinheiro vá para
uma conta separada em nome da securitizadora, ao invés de caírem na conta do
empreendedor.
Essa garantia é fundamental para o funcionamento
dos CRIs pulverizados, pois garante que o fluxo seja pago independente da saúde
financeira da empresa devedora. Um exemplo prático dessa garantia pode ser
observado quando um dos devedores do fundo RECR11 entrou em recuperação
judicial, mas o fundo seguiu recebendo as parcelas do CRI.
Fonte: Relatório Gerencial RECR11
É importante mencionar aqui que no episódio da GPK
x Hectare essa garantia foi revogada por 60 dias na justiça a pedido da Gramado
Parks, demonstrando a insegurança jurídica existente no Brasil.
2º) Cota Sênior/Subordinada: Os detentores das
cotas Sênior recebem o dinheiro primeiro do que os que possuem cotas
Subordinadas, estes últimos começam a receber somente quando todos os da série
Sênior tiverem recebido. Esse esquema é representado na figura abaixo (Créditos
ao Canal FII Fácil):
Logo, se um fundo quer ser mais conservador basta adquirir mais cotas Sênior, que possuem menor risco de crédito (e menor rentabilidade).
3º) Razão de fluxo PMT (parcela mensal) mínimo: Os
CRIs são estruturados de forma que o pagamento mensal seja inferior ou bem
inferior a entrada de dinheiro mensal. Por exemplo, uma razão de fluxo mensal
de 190% significa que a entrada de dinheiro foi quase o dobro do necessário
para pagar o PMT do CRI, nesse caso, esses 90% excedentes seriam destinados a
incorporadora.
Todos os CRIs pulverizados que eu conheço possuem
uma Razão PMT mínima, ou seja, um patamar em que o incorporador (devedor) se
compromete a manter, geralmente esse mínimo é de 110% a 130%. Quando a razão
cai para tais níveis é comum que se peça para o devedor colocar mais garantias
(o que não acontece na prática) e os excedentes param de ser repassados ao
devedor (comento no próximo tópico com um exemplo).
A razão PMT também serve para você analisar a saúde
da carteira dos CRIs, comparando a evolução de um mês para outro.
Na imagem abaixo um recorte do Relatório Gerencial
do fundo VSLH11, que há meses vinha mostrando uma razão PMT abaixo de 100% e
bem abaixo do mínimo, o que exemplifica o que disse acima: quando a razão de
garantia cai é porque o empreendimento não está performando bem e fica difícil
para o devedor colocar mais garantias para reenquadrar o indicador.
Fonte: Relatório Gerencial VSLH11
4º) Retenção do fluxo mensal: Caso a razão de fluxo
mensal caia muito, por exemplo, para 115%, a securitizadora pode não repassar
esses 15% extras para a incorporadora e reter para pagamento do CRI. Essa
proteção é melhor explicada no vídeo do link a seguir (17:00): https://youtu.be/MKVs_p75GCs?t=1020
5º) Coobrigação dos sócios: Quando o fluxo mensal
cai muito, para 80%, por exemplo, algumas incorporadoras complementam os 20%
restantes, pois a incorporadora/sócios não tem interesse em se enrolar e ter
garantias acionadas. Essa garantia é comentada em uma Live com os gestores da
Hectare, 12:50 até 14:00: https://youtu.be/7b3jT-0AFCo?t=770
6º) Fundo de reserva ou Fundo de juros: É como se
fosse um cheque caução, o devedor deposita uma certa quantidade de PMTs em uma
conta em nome do CRI. Geralmente tais fundos tem o suficiente para o pagamento
de 2 PMTs, no entanto, esse fundo de reserva pode "socorrer" o CRI
por mais do que esse tempo. Por exemplo, em um caso em que a receita do CRI
seja suficiente para apenas 50% do PMT e o fundo fosse utilizado, ainda
restaria 1,5 PMT de reserva. Ou seja, mesmo em uma situação de grande estresse
como a descrita, o CRI ainda poderia honrar por 4 meses. Teoricamente a empresa
teria que repor esse fundo em caso dele ser utilizado, o que geralmente não
acontece, pois se o fundo de reserva foi utilizado é porque a situação da empresa
não se encontra muito boa.
Também é comum a criação de fundos de juros, que
servem para pagar a parcela de juros enquanto o empreendimento ainda não está
gerando renda. Na verdade, essa prática nada mais é do que devolver parte do
dinheiro emprestado aos poucos e só serve para efeito psicológico.
7º) Alienação fiduciária: Em português claro, tomar
o imóvel do devedor. Está é uma garantia extrema, e é evitada ao máximo pelos
gestores devido a dor de cabeça, custos jurídicos e desgaste na imagem do
fundo. Entretanto, quando não há opções, essa garantia é acionada e o imóvel
vai a leilão, pagando a dívida e repassando o restante para o devedor. Caso não
se feche negócio no segundo leilão os imóveis dados em garantia passam a fazer
parte do patrimônio do fundo.
Curiosidade: caso acessem os relatórios gerenciais
de MXRF11 irá encontrar imóveis que foram alienados no passado e que ainda não
foram vendidos.
Em alguns casos tem-se a alienação de quotas de uma
SPE (Sociedade de Propósito Específico), que é um CNPJ criado especificamente
para desenvolver um determinado projeto. Nesse caso o risco é maior, pois uma
SPE pode carregar outras dívidas, dificultando a alienação dessa SPE.
8º) LTV (Loan to Value): Traduzindo, valor do
empréstimo comparado com o valor das garantias. Exemplo, dei uma entrada de 400
mil e fiz um empréstimo de 600 mil para comprar um imóvel de 1 milhão de reais.
Nesse caso o LTV seria: 600/1000 = 0,6 = 60%. Então, caso o CRI tome um imóvel,
poderia vender ele com menos dificuldade, já que foi "comprado" por
um valor bem inferior ao seu valor de avaliação inicial.
Quanto menor o LTV, melhor, tome cuidado com
operações com LTV acima de 70%, pois é muito comum que as garantias dadas sejam
supervalorizadas no momento da estruturação do CRI ou que o valor de tais
garantias vá se deteriorado com o passar dos anos caso o empreendimento não dê
muito certo.
9º) Fundo de obra: Um CRI possuir fundo de obra
significa que o montante residual para concluir a obra fica nas mãos da
securitizadora e esse dinheiro é liberado conforme a evolução das obras.
Outra prática muito comum é só fazer a
securitização dos recebíveis caso o valor captado seja suficiente para
completar 100% das obras. Por exemplo, faltam 10 milhões para um incorporador
terminar uma obra, então a securitizadora não irá financiar 5 ou 6MM, o mínimo
será os 10MM restantes para finalizar a obra.
10º) Fiança nível pessoa física / Fiança dos sócios
/ Aval dos sócios: Resumidamente, caso as garantias da SPE (Sociedade de
Propósito Específico) não sejam suficientes, a securitizadora tem o direito de
ir bater na porta dos sócios da SPE para acionar outras garantias. Não se
animem muito com essa garantia, chegar nela é um caso extremo e até lá a pessoa
já tirou tudo do nome.
11º) Covenants: São restrições e/ou obrigações que
a empresa assume, normalmente em relação ao nível de endividamento máximo.
Geralmente as operações com garantia real (alienação fiduciária) usualmente
possuem covenants de LTV máximo. (Adaptado do RG de KNHY11)
Essa garantia é muito útil para acionar o
vencimento antecipado (obrigar o devedor a recomprar a dívida) de operações com
problemas.
12º) Cash Sweep (varredura no dinheiro): Consiste
no repasse integral de receitas extraordinárias, essa garantia é muito comum em
CRIs de incorporação vertical, quando o devedor pessoa física consegue
financiamento imobiliário junto a um banco, que é muito mais barata que a
dívida diretamente com o incorporador. Com essas entradas extras parte do
principal é amortizado e geralmente se libera correção monetária passível de
distribuição.
Extra Multipropriedade: Com relação aos CRIs de Multipropriedade gostaria de fazer um alerta: As garantias desse segmento são mais mercadológicas do que reais (imóveis). Digo isso porque o cálculo das garantias leva em consideração o mesmo espaço sendo vendido mais de uma vez, então caso o imóvel seja levado a leilão, o valor da venda não será suficiente para quitar a dívida.
Extra True Sale: Significa que a empresa que vendeu seus recebíveis não possui responsabilidade alguma sobre o pagamento ou não dos devedores pessoa física
Extra Material Devant: Deixo aqui um material
oferecido pela Devant explicando garantias em CRIs pulverizados:
Excelente matéria, parabéns!
ResponderExcluirMas acredito que em: "...demonstrando a insegurança jurídica inexistente no Brasil" você quis dizer "..demonstrando a insegurança jurídica EXISTENTE no Brasil" ou "...demonstrando a SEGURANÇA jurídica inexistente no Brasil" certo?
Muito obrigado pela correção!
ExcluirGraças a Deus achei esse blog. Muito bom.
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