Para facilitar o entendimento vou dividir em 3 etapas:
1) análise setorial: escolher os melhores segmentos
2) análise intrasetorial: escolher as melhores
opções dentro de um determinado segmento
3) valuation: determinar um ponto de entrada seguro
1. Análise Setorial
Antes de mais nada saiba que a análise de fundos de
tijolos é uma análise mais qualitativa do que quantitativa. E minha principal
base teórica, que é muito relacionada a prática, são as forças competitivas de
Michael Porter, caso nunca tenha tido contato recomendo a leitura do livro ou
ao menos artigos sobre o tema.
As 5 forças de Porter são:
1. Ameaça de novos entrantes: facilidade com que
novos imóveis são construídos
2. Ameaça de produtos substitutos: risco de
mudanças no mercado afetarem o segmento
3. Poder de barganha dos clientes: análise de quem
precisa mais de quem, o fundo precisa mais do inquilino ou o inquilino
necessita mais do imóvel
4. Poder de barganha dos fornecedores: não se
encaixa muito bem em fundos imobiliários
5. Rivalidade entre concorrentes: nível de disputa
pelos inquilinos
A seguir a análise das forças de Porter para cada
um dos segmentos:
1.1. Shoppings
1. Ameaça de novos entrantes: considero como muito
baixa, já que shoppings demandam grandes espaços em locais movimentados, logo
os terrenos disponíveis são muito escassos. Além de que construir shoppings
pode custar centenas e centenas de milhões e o risco do novo shopping não
atrair clientes é uma grande preocupação
2. Ameaça de produtos substitutos: No caso dos shoppings
é a migração para o comércio online, que é um risco real. Entretanto, algo que
minimiza esse efeito é a substituição do comércio para serviços, que em alguns
casos não tem como ser migrado para a internet (salão, academia, faculdades,
etc.)
3. Poder de barganha dos clientes: lojas âncora
possuem um poder de barganha bem elevado sobre o shopping, no entanto, para
lojistas menores o poder está com a administração do shopping. Mas é claro que
o que vai ditar essa batalha é o nível de vacância do imóvel
4. Poder de barganha dos fornecedores: não se
encaixa muito bem em fundos imobiliários
5. Rivalidade entre concorrentes: depende muito da
proximidade de outro shopping
Conclusão: proporciona bastante segurança, junto de
fundos de Renda Urbana é um dos meus segmentos favoritos
1.2. Galpões Logísticos
1. Ameaça de novos entrantes: Considero como
extremamente alta, um galpão logístico leva apenas cerca de 1 ano para ser
“levantado”. Além de que a escassez de terrenos para a construção é a menor de
todos os segmentos. Dizem que no Last Mile (até 30km dos grandes centros) já há
escassez de terrenos para a construção de galpões devido ao avanço das cidades,
mas tenho minhas dúvidas.
2. Ameaça de produtos substitutos: Não consegui
encontrar algo que se encaixe nessa força
3. Poder de barganha dos clientes: Nesse segmento
há muitos casos de empreendimentos Sale and Leaseback e monoinquilino, situação
péssima para o fundo, já que uma eventual desocupação tem potencial de causar
vacância relevante para o FII. Quanto maior a concentração no inquilino, maior
o poder de barganha dele. A situação oposta são os condomínios logísticos, em
que há uma gama muito maior de inquilinos, diminuindo o poder desses e
facilitando o reajuste de aluguéis.
Ainda dentro dessa força é necessário levar em
conta que para o consumidor final tanto faz o centro de distribuição de onde
veio o produto requisitado, então na maioria dos casos não existe uma
“fidelização” do imóvel (esse ponto vai ficar mais claro quando você chegar na
análise de Renda Urbana)
4. Poder de barganha dos fornecedores: não se
encaixa muito bem em fundos imobiliários
5. Rivalidade entre concorrentes: No momento em que
escrevo (maio/22), não visualizo tanta disputa entre galpões, já que o mercado
está positivo para os proprietários, mas com a entrada cada vez maior de
galpões novos e modernos a disputa deve se acirrar.
Conclusão: segmento extremamente especulativo
1.3. Lajes Corporativas
1. Ameaça de novos entrantes: Baixa, devido ao
longo tempo de construção (3 a 4 anos) e escassez de áreas para a edificação de
novos imóveis, principalmente em áreas mais privilegiadas (onde vão meter mais
um prédio na Faria Lima?).
2. Ameaça de produtos substitutos: Trabalho Home
Office e reuniões online, que na minha opinião vai diminuir muito a demanda por
áreas
3. Poder de barganha dos clientes: Vai depender da
porcentagem que o inquilino representa para o imóvel/fundo, mas geralmente os
prédios possuem mais de um inquilino, algo que contribui positivamente para os
proprietários.
Outro fator, até mais importante do que primeiro, é
o nível de vacância na região. Alta vacância significa inquilino colocando
proprietário contra a parede, que é a realidade atual dos fundos de lajes.
Já a “fidelidade” do inquilino ao imóvel varia
bastante, tem algumas empresas que estão a anos em determinado local e tal
localização se torna importante para ela. Entretanto, nessa crise das lajes se
ouvia bastante de inquilinos aproveitando da vacância elevada para migrarem
para uma região melhor. Então pode-se concluir que Lajes em localizações B
possuem uma baixa fidelização com o inquilino.
4. Poder de barganha dos fornecedores: não se
encaixa muito bem em fundos imobiliários
5. Rivalidade entre concorrentes: Muito elevada,
vide as condições oferecidas para novos contratos (carência e descontos)
durante e após a pandemia.
Algo que também afeta negativamente essa força competitiva
é a proximidade entre os imóveis.
Conclusão: ninguém sabe até onde vai o impacto do
Home Office para o setor, tornando-o muito nebuloso
1.4. Renda Urbana
1. Ameaça de novos entrantes: Estabelecimentos de
comércio (supermercado, lojas...) ou de serviços (análises clínicas,
consultórios...) necessitam estar em locais com grande fluxo de pessoas, ou
seja, bem localizados. Tais regiões geralmente estão bem ocupadas, dificultando
a entrada de novos concorrentes (construção de novos imóveis na região)
2. Ameaça de produtos substitutos: Esse é um
segmento que pode vir a ser afetado negativamente pela migração para o comércio
online
3. Poder de barganha dos clientes: Nesse segmento
pesa muito o fator fidelização, a localização é algo muito importante para o
inquilino, já que seus clientes estão acostumados com tal local. Logo, o custo
para o inquilino mudar vai muito além do dispêndio com movimentação de
materiais físicos e reformas, o principal custo é a perda potencial de clientes
devido a mudança, então o inquilino precisa pensar muito bem antes de devolver
o imóvel.
Como o custo de mudar de imóvel é algo caro para o
inquilino, o poder de barganha do proprietário aumenta bastante.
4. Poder de barganha dos fornecedores: não se
encaixa muito bem em fundos imobiliários
5. Rivalidade entre concorrentes: Depende muito da
vacância na região
Conclusão: Considero um excelente segmento, pois a
localização é algo fundamental para o inquilino e acredito que as chances de
haver escassez são maiores
2. Análise Intrasetorial
Definido qual segmento você quer aportar, o próximo passo é definir qual fundo escolher.
Não vou detalhar esse tópico porque o blog já conta
com a análise de uma infinidade de fundos.
2.1.
Shoppings
Tirando aqueles com rolos (ABCP11, PQDP11 e
BPML11), considero todos os fundos do segmento como muito bons, mesmo com
gestores fazendo movimentos controversos (VISC11 e a emissão da Ancar / MALL11
comprando shoppings no RJ com RMG).
2.2. Galpões
Logísticos
Tenho um post específico para escolher as melhores
opções nesse segmento:
https://fiica-esperto.blogspot.com/2022/02/como-analisar-fundos-logisticos.html
2.3. Lajes
Corporativas
Pior segmento na minha humilde opinião, se for para
especular prefiro galpões logísticos e para longo prazo prefiro os outros dois
segmentos restantes.
2.4. Renda
Urbana
Possui apenas 3 opções até o momento em que escrevo
(TRXF11, EVBI11 e HGRU11), então não há muito o que escolher, caso tenha
tolerância a alavancagem coloque mais TRXF11, caso seja mais conservador inclua
mais HGRU11 e caso EVBI11 tenha liquidez no momento em que você estiver lendo
esse post, dê uma chance para ele.
3. Valuation
Definido o segmento e os melhores fundos, chegou a hora de definir um ponto de entrada seguro.
E o que seria um ponto de entrada seguro? É um preço onde está embutido o risco de suas projeções futuras não se concretizarem. Quanto mais incertezas o segmento/fundo tiver, maior deve ser o prêmio por ter tal fundo em carteira, o famoso “carrego”. A seguir do maior carrego para o menor carrego (mais arriscado para menos arriscado):
Lajes Corporativas > Galpões Logísticos > Renda Urbana > Shoppings (estou ciente de que o mercado não concorda comigo)
Outro detalhe importante, VP em FIIs de Tijolos não servem para quase nada. No começo dava muita atenção, mas hoje em dia ignoro na maioria das vezes, tanto é que quase me esqueci de colocar esse item na análise. Prefiro me atentar aos rendimentos distribuídos, que é algo muito mais concreto.
Como não tenho tempo de ficar fazendo post com frequência, vou fazer a análise considerando um cenário mediano (IPCA ~ 4,5% e SELIC ~ 8%). Então a partir desse ponto ignore as taxas em que estamos vivendo hoje (maio/22) e considere as taxas apresentadas acima.
Aqui vai uma polêmica: FIIs de tijolos são mais arriscados do que FIIs de Papel. Isso acontece porque na papelada você já conhece de antemão as taxas que você vai receber num cenário sem Default, já em FIIs de tijolos é uma caixinha de surpresa. Portanto, acredito que para um FII de tijolo valer a pena ele deve pagar mais do que um FII de Papel Middle Risk (aproximadamente IPCA + 6 a 7%), já que considero o risco de Default muito baixo nos FIIs Middle Risk atuais, ou seja, o FII de tijolo deve ter um Yield superior a 7%, para valer a pena o risco de vacância, descontos, ciclos, etc.
Outro motivo para eu exigir uma remuneração maior do que o prêmio dos FIIs de Papel é que nesta classe de ativos a gente recebe a inflação de forma isenta, já nos tijolos temos que pagar 20% de I.R. na maioria das vezes.
A seguir apresento um carrego que considero justo
para o cenário descrito.
3.1.
Shoppings
Poucos meses após o fim da pandemia e fechamentos absolutos os shoppings já se encontram com índices de ocupação superiores a 90%, demonstrando como esse segmento é resiliente.
Como acredito bastante em shoppings e em sua
capacidade de repassar a inflação para o aluguel, aceitaria um carrego na casa
dos 0,60% a.m. ou 7,2% a.a.
3.2. Galpões
Logísticos
Fundos logísticos vivem uma lua de mel que já dura
uns 3 anos e até hoje não vi altas significativas do preço pedido por m², mesmo
com 2 anos seguidos de inflação com 2 dígitos.
Dica: utilize os Relatórios Gerenciais de VILG11
para acompanhar o valor pedido pelo mercado
Como resultado do exposto acima e no primeiro passo, considero que um carrego bom seja na casa dos 0,70% a.m. (8,40% a.a.) para cima.
Bom lembrar que o objetivo do post é Valuation para
compras com objetivo de encarteirar (sem previsão de venda). Para estratégias
de trade, principalmente a de aproveitar a queda dos juros, eu aceitaria
valores abaixo do patamar mencionado acima.
3.3. Lajes
Corporativas
Por ser o segmento mais arriscado dos 4 mencionados
nesse estudo, o prêmio de risco necessita ser maior. Para lajes fora da Faria
Lima colocaria um carrego a partir de 0,75% a.m. (9% a.a.) sendo bem generoso.
Para lajes na Faria Lima estaria contente com uns 0,65% a.m. / 7,80% a.a.
3.4. Renda
Urbana
Como sua concentração é maior do que a de FIIs de
shoppings, acredito que um carrego de 0,60% a 0,65% a.m. (7,2% a 7,80% a.a.)
seja adequado.
3.5. Resumo
Shoppings: DY = 7,20% ou FII Papel MR + 0,2% a.a.
Galpões Logísticos: DY = 8,40% ou FII Papel MR +
1,4% a.a.
Lajes Corporativas: DY = 9,00% ou FII Papel MR +
2,0% a.a.
Renda Urbana: DY = 7,80% ou FII Papel MR + 0,80%
a.a.
- Análise de fundos de tijolos é algo muito mais complexo do que o exposto aqui
- Não sei futuramente, mas atualmente sou uma pessoa que prefere muito mais FIIs de papel do que FIIs de tijolos (observação completamente desnecessária de ser dita)
- Não utilize o exposto aqui como recomendação de compra/venda
Corajoso. Racional bem elaborado. Parabéns.
ResponderExcluirTenho acompanhado os comentários no ClubeFii há quase um ano e já aprendi muito sobre FII's por ali. Sempre gostei de seus comentários, embora muito críticos e um pouco pessimista. Agora descobri esse seu blog e estou achando muito bom. Esse post p.ex. está muito bem explicado e detalhado. Pra mim que sou leigo é uma ajuda e tanto. Parabéns! E obrigado pela dedicação.
ResponderExcluirNa pandemia os shoppings sofreram mais que os outros, lajes atualmente é o pior mesmo, mas no futuro não sei. Setor logístico foi o que deu melhor resultado, mas conforme você colocou, é relativamente fácil vir novos concorrentes... Abs
ResponderExcluirExcelente análise. Pra mim LAJE está morrendo. Vai ser uma morte dolorosa e lenta. Não tenho mais nenhum desde a pandemia. Decisão acertada. Home Office veio pra ficar. A moda agora até mudou: é anywhere office. Tem gente trabalhando pra gringa no Brasil.
ResponderExcluirNos EUA já morreu! Veja a reportagem abaixo:
Excluirhttps://www.infomoney.com.br/onde-investir/especuladores-dobram-aposta-em-crise-de-credito-e-operam-contra-reits-os-fiis-americanos/
Poderia nos dar um exemplo de valuation?
ResponderExcluirO método mais fácil é anotar cada aluguel e deduzir a média 12m das despesas, achando o resultado e dividindo pelas cotas. Daí só aplicar o % a.a. que vc quer ganhar. Exemplos ALZR e GGRC. Não considero ganhos de capital neste cálculo porque é não recorrente (vide HGLG que não tem suporte recorrente para pagar os famosos 1,10)
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